ATO I – O Julgamento de Atená
Atená: Estamos no julgamento de tristes eventos entre os humanos.
CORO: Tristeza, desolação …
[Atená chama o Personagem]
Atená: O que testemunhaste?
Personagem: Testemunhar propriamente não, pois estava muito ocupado com tarefas essenciais à Nação.
Atená: Achas que poderias ter feito algo diferente?
Personagem: O que pode nossa precária vontade perante o desígnio dos Deuses?
CORO: Deuses! O que quereis dos homens por vós criados? O quê?!
Atená: chamo o sábio Tirésias: Tirésias, o que vês?
Tirésias: há os cegos e os surdos entre os homens.
Atená: E então?
Tirésias: há os que são cegos e também surdos.
Atená: Mas, e o futuro?
Tirésias: há ainda os cegos, surdos e descerebrados.
[Atená desiste e volta ao personagem]
Atená: Sentes culpa, remorso?
Personagem: O meu dever está em paz, o destino se interpôs.
[som de marchinha militar ao fundo]
Atená: O que farás a seguir?
Personagem: Volto ao nada de onde nunca saí.
CORO: Zeus! Esqueceste de dar cérebro aos homens.
Atená: Isto não está andando, deixo o Julgamento para as Erínias.
CORO: Oh! Deuses! Destino cruel; estupidez humana!
[som forte em crescendo de grasnado de corvos]
– Fim do Ato I –
ATO II – O Julgamento das Erínias
As Erínias e um tribunal com diversos personagens: Presidente, Ministros, Senadores.
Erínias: antes de soltar nossas Fúrias, a pedido de Atená, escutemos os acusados.
CORO: as Fúrias são impiedosas.
Presidente: de que me acusam?
Erínias: mostram que expôs o povo à morte.
Presidente: quais são as provas?
CORO: jazem cadáveres nas ruas.
Erínias: há gravações que denotam indiferença.
Presidente: nestes tempos existem hackers que forjam tudo.
Erínias: os ministros testemunharam.
[Chamam os ministros que falam em coro]
CORO: eis uns que nos imitam.
Ministros: nada vimos, nada ouvimos de ilegal.
Erínias: dizem que houve gritante descaso.
Ministros: tudo que foi feito seguiu as mais nobres leis.
Erínias: podem dizer quais?
Ministros: a manutenção da ordem, sem a qual é impossível governar.
Erínias: e os mortos?
Ministros: eles não votam.
[Erínias chamam os Senadores]
CORO: escondam-se! Zeus está irado.
Senadores: somos homens das escrituras.
Erínias: não vos espantais com o descalabro?
Senadores: somente julgamos o que está devidamente protocolado.
Erínias: e o que vistes? O clamor do povo?
Senadores: vimos na TV muitos de motocicleta felizes e comemorando.
Erínias: e os outros!?
Senadores: quais outros?
CORO: As Erínias demoram a soltar suas Fúrias.
Erínias: perdição, danação, mandem todos ao submundo!
[som de trompetes em Sinfonia de Haydn]
– Fim do Ato II –
ATO III – No reino de Hades
Personagem, Presidente, Ministros e Senadores.
Todos: Onde estamos? Há brumas e cheiro de fumaça.
CORO: queimadas vos perseguem! Infelizes eres.
Hades: aqui expiarão vossas culpas.
Presidente: não as temos, nossas intenções foram claras e consistentes.
Personagem: o que está acontecendo?
Ministros: seguimos ordens.
Senadores: aqui há algo que se possa legislar?
CORO: seguem ignorando! Perdição.
Presidente: exijo falar com um comandante fardado.
Hades: eres tolo ou tentas truques? Hermes me ensinou os melhores.
Ministros: somos úteis, dai-nos alguma tarefa.
Hades: Carregareis pedras de enxofre até a exaustão.
CORO: castigo aos infelizes.
Hades: e os Senadores ficarão despidos no limite das chamas ardentes.
Personagem: não me esqueçam, sigo o que for.
Presidente: com um cavalo me viro, ou uma motocicleta Harley-Davidson.
Hades: para ti um castigo exemplar … cantar o hino nacional sem parar junto aos comunistas que aqui estão.
CORO: Nêmesis é a Justiça, se não é feita no reino humano, será no divino.
O povo na Terra: agora sim, é Carnaval!!
[escutam-se sons carnavalescos]
– Fim do Ato III –
Que delícia. Mas, bota delícia nisto…. Como a tragédia grega é eterna: serviu para ontem. serve para hoje e servirá para amanhã.
Olá Eder, obrigada; diríamos, em vez de “rir para não chorar”, “rir para poder chorar”, porque nossa lágrimas gelaram
Literatura, escrita, humor, tudo vale até Hades engolir os nefastos personagens e levá-los para onde jamais deveriam ter saído.
Sylvia, sim! “jamais deveriam ter saído”, não merecem viver entre os humanos, nem entre os animais.
Liliana, seu teatro é um espetáculo genial. Gostei muito mesmo, ainda que tenha explicitado o meu parco conhecimento sobre a Mitologia e Literatura greco-brasileira.
Que maneira elegante de nos elucidar sobre o momento presente sem ter que usar os termos chulos aos quais estamos habituados, conformados com as mal escritas linhas ( mídia) que nada de novo nos contam!
Como bem dizem os escritores do 50+: Nada de essencial muda, “nem aqui nem na China”, digo, no decorrer da História do Brasil( Estamos todos de acordo!
Apliquemo-nos a aprofundar na Mitologia que tudo já sabia! ( nao no MITO, por favor)!
Parabéns Liliane!
carinho
B
Liliana, nesta tragédia greco-brasileira há silêncios. E neles o leitor (a) vê, escuta e pensa. Não sei explicar, estou vivendo.