Clube dos Escritores 50+ Eder Quintão Impressões machadianas

Impressões machadianas, de Eder Quintão

Todos temos nossas impressões machadianas. Como a minha. Quando trabalhava na Rockefeller University, em Nova York, na década de 1960, conheci a esposa de um estudante que se apresentou numa festa como sendo neta de Thomas Mann. Estudava literatura. Perguntou-me se conhecia o maior escritor da língua portuguesa, um tal “Mequeido”. Espantou-se muito quando respondi que não conhecia. Prudente, pedi que soletrasse “Mequeido”: era M-A-C-H-A-D-O!

Continuar lendo
Clube dos Escritores 50+ Lourdes Gutierres Caramelo

CARAMELO, por Lourdes Gutierres

Já não há mais gente por aqui, não há mais casas, só se enxergam os telhados.
E, em um deles, o cavalo sustenta seu corpo, tenta se equilibrar na superfície
inclinada, seu olhar se estende no mar barrento e, entre tantos objetos arrastados, o corpo de um homem segue inerte nos tropeços das ondas. A noite tinge de tristeza o coração do cavalo em cima do telhado, sente frio, fome, mas precisa estar atento, patas firmes, olhos abertos.

Continuar lendo

­Yamamura, por Lilian Kogan 

Quando eu tinha uns 12 anos, Lilian, minha amiga e xará, veio com uma novidade incrível. – Vamos lá na loja Yamamura, quero te mostrar algo diferente que você vai adorar. Era o início dos anos 70 e da loja de lustres, que cresceu incrivelmente nos anos vindouros. Ficava numa rua entre a Rua da Consolação e a Avenida Angélica, era pequena e guardava um segredo bastante difundido na colônia nipônica, um cabelereiro no fundo da loja. É claro que precisávamos ir lá.

Continuar lendo

#sobreliteratura
ESCRITORA EM CRISE, por Zulmara Salvador

Eu queria escrever um romance. É muito lindo romance…Mas me deu preguiça antes de começar, porque romance tem que ter o personagem principal, que transita por vários núcleos de outros personagens, e tem que acontecer um monte de coisas com o tal personagem e seus núcleos todos e, ainda por cima, tudo tem que fazer um certo sentido, mesmo que não tenha sentido nenhum, e os personagens têm que se relacionar e o sol tem que nascer e a lua tem que brilhar e passarinhos têm que cantar e o personagem tem que ter um cachorro, ou gato

Continuar lendo
Clube dos Escritores 50+ Regina Valadares Sempre soube

#mães
Sempre soube, por Regina Valadares

A barra de chocolate Kopenhagen escondida na gaveta de camisolas. As garrafas de refrigerante Crush na porta da geladeira, o único refrigerante que eu detestava. O estalinho dos seus joelhos passando para ver se estávamos dormindo. O cigarro Charme repousado no cinzeiro. Os vestidos de poás. O barulho do salto dos seus sapatos. Os brincos de pérola. A bolsa recheada de bolsinhas, todas arrumadas por tamanho! Ah como eu gostava de mexer na sua bolsa!

Continuar lendo
Clube dos Escritores 50+Zulmara Salvador Minha mãe

#mães
Minha mãe, por Zulmara Salvador

Antes de eu nascer, minha mãe não existia. Mas depois que eu nasci, vim a conhecê-la e ela passou a existir (para mim). Ela era um mundo inteiro de peitos, com leite quentinho e cheiro macio e pele doce e vozes amáveis. Só depois que eu nasci pude conhecer minha mãe, é claro. Gostaria de tê-la conhecido antes, para saber o que pensava, o que sentia, a quem amava e se me queria… Antes de eu ter nascido.

Continuar lendo
Clube dos Escritores 50+ Paulo Akira Perfume de fruta

#mães
PERFUME DE FRUTA, por Paulo Akira Nakazato

– Preciso enganar o estômago. Me dá um pedaço. Mãe, não quer também? – olhei-a quieta na cadeira, com os olhos miúdos e as cãs bordando as orelhas com franjas de pensamentos. – Humm…? – Mãe, não quer mamão? – repeti. – Espera, né! – Ah, mãe, “otossan” não vai nem perceber. Tem tanta fruta no butchidã” que ele vai ter indigestão – respondi.

Continuar lendo