Paterson, por Bettina Lenci


 

 

R.M. Rilke escreve a um jovem poeta do século XXI

 

Paterson ,  você é um poeta e pode ignorar, disfarçar, mas sofre por não se dedicar em tempo integral  à sua alma. Poeta e alma são irmãos  siameses. Não é importante  se nem sabem quem  você é !

Se você é apenas ( como é importante este apenas! ) um motorista de ônibus, você é poeta. Passou  ao largo das controvertidas discussões entre brancos e negros, heterossexuais e liberdade de gênero, direita e esquerda, enfim, polêmicas que levam, invariavelmente, o título de minorias contra maioria.

Os novos filmes que veremos em 2018 acusam as maiorias com ódio incontido.

“ Três anúncios para um crime” por exemplo, conta a história de uma mãe que investe contra as instituições que não descobrem quem matou sua filha. O filme consagra uma “ruptura entre heróis e anti-heróis sem brechas para chororô…”( Folha Ilustrada 18/9).

Outro filme vencedor no festival de Toronto conta a história real da patinadora banida dos ringues, ”uma das pessoas mais odiadas do esporte  americano por ter agredido uma colega”

A poesia  –  esperança redentora contra vinganças e ódios crus-    contam a revolta. Impregnada de precisão ,  recupera e define  o tom  da indignação. Engano achar que  poesia “é coisa de romântico”!    Ela insere o sentido da organização e ordem através da rima. Pode exprimir, de maneira suave, o ódio expresso em violência explícita.

Paterson, você é minoria. É poeta. O poeta tem concepções próprias da realidade que o circunda e aqui vai a minha catarse: não consigo acompanhar as transformações do mundo  que ocorrem  no mesmo instante que  lhe escrevo .  Fazemos  parte  da diversidade. A diversidade é moderna,  pós moderna, contemporânea.  Não há aqui apologia a ser feita ao passado. Se compararmos,  deixaremos de acreditar na lei de Darwin e nos tornaremos, lentamente,  uma nova espécie de dinossauros.

Paterson, você, personagem principal do filme , sou eu! Sou minoria. Sem orgulho, sem revolta, sem mágoa da maioria.

Continue  guiando o seu ônibus a cada dia, na mesma hora, comendo o mesmo lanche, passeando pontualmente na hora do xixi do  cachorro , parando para usufruir da conversa do bar do  seu amigo que ao te ver chegar já prepara  a cerveja.

Com afeto, caro poeta,  continue olhando o rio passar da mesma ponte, todos os dias de sua vida. Ausente-se alguns minutos por dia!  

 

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BETTINA LENCI – Uma empresária que se realizou tendo como início profissional a história da arte e a fotografia, mas que, posteriormente, descobriu que lendo e escrevendo é possível criar um mundo com um olhar agudo sobre o cotidiano de todos nós.

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