Está em pane, isto quer dizer que parou. Mal orgânico provoca paradas, sejam elas cardíacas ou devido a acidente qualquer; o organismo para definitiva ou momentaneamente. Sua parada não era orgânica, tampouco sofria de epilepsia, pequeno mal, ausências momentâneas. Funcionava, ou poderia fazê-lo, normalmente, órgãos e funções preservadas, músculos e comandos em perfeito estado.
Não era esquizofrenia, como aquele que se achava uma pedra e permanecia imóvel alimentado por líquidos em canudos que absorvia em extrema lentidão. Simplesmente parou, não lembrava quando ocorrera, a família o viu estático fixando o horizonte. Aparentava se encontrar em estado contemplativo – vinha fazendo imersões em cursos de meditação, já que estava sentado num degrau da escada do portão sem se mover. Após duas horas, estranharam e, ao se aproximarem dele, somente ouviram murmúrios em resposta à pergunta do que estava fazendo, se iria ficar ali até a noite; estava esfriando.
Parecia absorvido em um mundo interior, mas fixava o olhar ao longe. Puseram uma manta nele e, passadas 10 horas de imobilidade, levaram comida. Alimentava-se aos poucos e devagar. À noite saia do lugar externo e se debruçava em qualquer janela da casa, quieto. Não atendia chamados, o celular descarregou e a família respondia a amigos: sim, já consultamos o médico, já fez tomografias e ressonâncias, pois se deixava levar docilmente ao hospital onde permanecia tranquilo no lugar em que o deixassem, mirando um ponto determinado.
Nunca deu explicação; emitia poucos sussurros, as palavras eram preciosas demais para serem pronunciadas; os gestos, valorizados ao extremo, se detiveram para não serem gastos. O tempo congelara, por assim dizer, em retenção para não mais serem desperdiçados: o instante, tudo se concentrava naquele instante do corpo imobilizado com o entorno girando em caleidoscópios vertiginosos cujo sentido se esvanecia; perdurava um momento, a quietude, o prenuncio do que será.
Inpirada e necessária alegoria, Liliana. Em algum momento, Liliana, todos iremos parar. Recomeçar depois; mas, antes e inexoravelmente,vamos parar.
Olá Luciano, parar e recomeçar, o ciclo da vida, não é? Obrigada
Alguém toma a decisão: não mais o giro incessante de todo entorno, então, busca seu tempo e espaço interior. Não está só, outro alguém observa seu movimento, a autora. Registro inspirador, Liliana.
Lourdes, sim, observar o movimento e o não movimento, o silêncio … Obrigada