Peguei a escova de dentes, mas deixei o vidro de shampoo e o sabonete líquido.
Propositalmente esqueci-me de um pé daquela meia branca com o desenho da Nike em azul.
Levei as roupas, mas deixei uma bolsa.
Os sapatos, levei todos.
Peguei meus papeis, minha caixa de recordações e os livros, porém, deixei dois, com frases marcadas e observações escritas a lápis, em muitas páginas.
Os mundos de Bettina Lenci
ou 12 crônicas sobre notícias sem importância
Tenho escrito crônicas a partir de notícias pouco importantes, mas que, justapostas, talvez possam criar um terceiro ângulo ou uma nova conclusão sobre essas informações inúteis. Este jogo nasceu na tentativa de preencher os vazios da minha alma. Com esforço, busco recuperar algum sentido poético que esteja perambulando acima da realidade crua que passa ao meu lado, qual nuvem escura anunciando tempo de raios e trovoadas.
Continuar lendoTALVEZ EU MORRA HOJE, poema de Clemari Marques
Talvez eu morra hoje…
Talvez não.
Talvez o avião caia no meio de uma tempestade
E junto com raios, trovões e toneladas de chuva,
Talvez caiam por terra todos os meus projetos, sonhos, esperanças, expectativas, desejos…
Sim!
#sextadepoesia Hominivorax, de Luciano de Castro
todas as mesas
estavam ocupadas
homens, mulheres e crianças
comiam pedaços de outros bichos
pedaços fritos e assados
servidos em bandejas de prata.
A força da grana, crônica de Carlos de Castro
– Você não estava sabendo? Só vamos ficar abertos até o final do mês.
A conversa se deu quando eu chegava a academia para um dos meus dois ou três treinos semanais. Me espantei quando vi um técnico desmontando o belo painel luminoso da entrada. Ao perguntar à recepcionista o que tinha acontecido, fui surpreendido com a resposta. Depois percebi que haviam colocado uma nota no quadro de avisos.
São Paulo se autodevora.
#emprimeiramão
ÂNGELUS, poema de Maria Cristina Prandini, extraído do livro Ponto Segredo
Há um momento do dia
em que eu sinto a passagem do tempo
Líquido que escorre
Espesso
Ponteiros plúmbeos de um relógio que se distorce
ao sol.
Os heróis eram outros,
por Carlos Schlesinger
O nome era engraçado para crianças e adultos. Gagarin. Parecia brincadeira. E, naqueles dias, era o que se falava. Gagarin, um astronauta russo, de olhos rasgados, sorria após ser resgatado do primeiro voo de um ser humano no espaço. Os americanos ficaram furiosos e partiram para a competição. Abria-se nova página na Guerra Fria entre as superpotências, a corrida espacial. A guerra era acirrada e novos nomes surgiam e se incorporavam ao conhecimento popular, assim como as façanhas que cresciam a cada dia.
Continuar lendoTA-TU-RA-NA,
por Tita Ancona Lopez
Era uma taturana verde claro, movendo-se lentamente sobre uma folha verde escuro. A folhagem forrava um muro bem mais alto do que ela mas, a taturana, estava na altura dos olhos. Sabia que não podia encostar o dedo, a avó dizia que taturana queima, tinha tanta vontade de pegar! Passou horas olhando o movimento do corpo comprido, devia cansar aquele mover-se com tantas perninhas, ela só tinha duas e não andava deitada, andava de pé.
Continuar lendoUma poeta na vidraça
reflexões sobre o novo livro de José Carlos Peliano, A Geometria flutuante das águas
Meu telhado não é de vidro, mas minha janela é. Meus poemas não são de vidro, mas minha inspiração é. O que escrevo vem não sei de onde, qual a dimensão que me envia, onde estão os pensamentos, que energia me leva a correr e anotar o que me chega antes que eu perca o bonde e a esperança de recordar. Do jeito que me veem podem revelar muito ou se perder pedaço a pedaço.
Continuar lendoSaber rir
nas rimas de Eder Quintão
Vou rir, rir
Rir para expelir
Lágrimas de ontem
E as que logo nascerão
Daquela tristeza de amanhã
Se não herdar lábios sabendo rir
A MESA, A COSTELA DE ADÃO, A ZONA CEGA, O PERFEITO
reflexões sobre livros e filmes de Bettina Lenci
Não sei escrever a não ser sobre uma superfície plana. Antes do
computador, escrevia em cadernos sobre uma mesa. Hoje a
inspiração depende do meu computador que não se encontra ao
alcance do texto que brilhantemente se escreve na minha cabeça.
…por que escrevemos?
#reflexõesmaduras
de Zulmara Salvador
O que fez Elizabeth Bishop escrever sobre tantas, tantas coisas e perdas? Por que escreveu?
Por que Mary Ann Evans se fez George Eliot só para escrever? Por quê?
Carolina Maria, que catava lixo, escreveu. Por quê?
E as irmãs Brontë?
J. K. Rowling inventou Herry Potter. Que bruxaria a fez escrever?