Os elefantes podem voar,
por Liliana Wahba

Convite para uma banca de qualificação de doutorado.

Essas bancas ocorrem um tempo antes da defesa para encaminhar o trabalho e corrigir distorções, assinalar complementações e considerar outras perspectivas.

Esta seria na FNUSC, universidade de excelência cuja Faculdade de Zootecnia Avançada possuía pesquisadores de nível internacional. A orientadora era pesquisadora B1 pelo NPqr,  e Helen foi convidada por ser sua área de especialização Psicologia Animal, ainda que não dispusesse dos créditos dos demais três doutos professores da banca.

A tese era ousada: os elefantes podiam voar e somente não o faziam porque não queriam. A orientadora estava animadíssima porque sua especialidade na teoria da evolução há tempos não desvendava uma novidade, tudo repetição. E agora, eis que surgia algo que ocasionaria furor e lançaria seu nome para a posteridade.

No dia da banca, Helen se viu na mesa com o doutorando, a orientadora e mais três doutores colegas. Ela foi a última a comentar o trabalho. Os demais discorreram sobre a evolução dos grandes mamíferos, a ascendência dos dinossauros, os pterossauros voadores, as cartilagens das orelhas, a linhagem que vincularia repteis e mamíferos – somente alguns deles. Cada um trazia argumentos enciclopédicos e a orientadora luzia de satisfação.

Havia uma testagem comprobatória, claro, e esta foi exposta no método a aplicar e seu correspondente procedimento. Helen, quando chegou sua vez, indagou se esse procedimento não seria insuficiente para provar a hipótese principal e rejeitar a hipótese nula. Consistia em mostrar figuras de aviões, pássaros e objetos voadores junto a fotos terrestres. Se o elefante abanasse as orelhas para os objetos voadores revelaria indício de sua resposta condicionada ao voo. Todas as ocorrências a serem mensuradas estatisticamente. O doutorando, orgulhoso de si, afirmou que já o tinha testado num projeto piloto.

Helen arguiu que as provas se mostravam fracas, pois:
1. as fotos de objetos voadores eram todas em céu azul, e talvez os elefantes respondessem ao estímulo cor,

2. não havia grupo experimental e  grupo controle,

3. não se distinguia a proveniência dos elefantes, se eram de circo, de zoológico, da savana africana (onde, dependendo do lugar, estariam expostos à visão de balões a gás),

Finalmente, 4. como compreender o porquê deles terem inibido esse desejo se tinham condições de voar?  

O doutorando empalideceu e os demais reagiram com frieza. O fato é que não foi chamada para a banca final e nunca mais por nenhum desses luminares, o que lhe ocasionou uma perda de pontos no currículo acadêmico.

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