A mulher mora numa casa velha, parecida com a dona, uma velha, velha mesmo, encurvada, trapenta, descabelada, rodeada de gatos, sempre se enroscando nas pernas rendadas de varizes azuis. A velha dá pena, esqueceu o nome das pessoas, mas todo o mundo gosta dela, até eu, ela é gente boa, coitada. Bem, como eu ia dizendo, pra ela ninguém tem nome, é o homem da quitanda, o homem do lixo, o homem do correio, o homem da rua, o homem da parede, o homem menino, o homem ladrão e por aí vai.
Todo mundo ajuda, a gente tem pena, não é porque é pobre, não é porque é feia, e fedida, e a casa mais fedida ainda, que a gente não ajuda e não cuida. Tudo na casa dela já gorou, a pia, chama o homem da pia, a privada entupiu, chama o homem, o gás acabou, chama o homem, o mendigo vem pedir comida, chama o homem – separei um arroz pra ele -, o homem do jornal que vem recolher jornal velho cheio de merda de gato.
É só ela pedir, cadê o homem da água, cadê o homem da luz, cadê o homem do quintal, um aparece com balde, outro com vela, outro ainda com vassoura.
E quando ela chama o homem do conserto, não vem ninguém, ninguém aparece, até que um dia ela perguntou mais uma vez, o homem do conserto não vem? que ele chegou, pegou ela no colo e levou pro céu.