Férias. Uma imagem de felicidade que vai se defasando à medida que entramos na faculdade. Fica gravada como tendo sido uma época feliz, depois que saímos da faculdade para enfrentar a vida!
Natal. Suscita igualmente a mesma fantasia. Supondo que o universitário já esteja casado e com filhos, as duas imagens se sobrepõem.
Férias. Com a proximidade das datas e o merecido descanso dos adultos, ela deixa de ser uma alucinação, uma miragem para, eventualmente, tornar-se realidade e nos fazer esquecer o “suplício” que foi o período natalino.
Natal. Tendo em vista o número de novos avós que surgem com os segundos e terceiros casamentos dos filhos; novas mães ou duas ou três madrastas; vários primos, sem consanguinidade alguma, meio que obrigados a se darem bem; pais e mães tendo que cuidar para não ofender nenhum(a) ex esposa/marido ,afinal, “mãe/pai de meus filhos” , como dizem! Quiçá, com renovado amor dedicado aos seus exes, inicia-se a negociação anual entre os casais separados. Os dois eventos chegam após transações Inter familiares sobre quem vai festejar o Natal, como e em casa de quem, assim como as férias, que filho vai passar as férias onde e com qual dos pais.
Férias. Nem sempre o clima é tranquilo, todos obrigados a dividir um mesmo espaço por tempo mais longo. Durante as férias, os adultos voltam a reclamar do trânsito impossível durante as festas, apontar a inflação sobre os custos, discutir o Brasil que sempre vai mal.
Natal. O tempo da confraternização é de horas. Comida saborosa, árvore de Natal enfeitada, presentes distribuídos, crianças correndo pela sala, os mais velhos mergulhados em seus smartfhones, o momento gravado em selfies. O grupo de família, todos sorrindo, não contará mais, no álbum de fotos, que a felicidade esteve ali, uma vez que o celular engole o presente e o passado e os guarda nas nuvens onde nunca mais será testemunha da felicidade naquele dia.
Natal e Férias, em famílias divididas, são questões tormentosas e diria quase irreconciliáveis. Em geral o resultado das negociações recai sobre o filho que passa o natal com uma família e as férias com outra, por vezes a contragosto, pois gostaria que seus pais não tivessem se separado.
A tradição. O amigo secreto quebrou uma das mais significativas tradições de Natal. No passado, os presentes eram escondidos até o dia 24. Na volta da missa do galo, Papai Noel os havia deixado embaixo da árvore. Na Europa, o costume era ele chegar dia 25, quando as crianças, assim que acordavam, procuravam saber se ele tomou o leite e comeu os biscoitos deixados por elas, depois corriam para abrir os seus presentes. Hoje o costume é comprá-los pela internet e recebê-los sem serem embrulhados com o cuidado devido, o nome da loja e o “de mamãe para Joãozinho”, numa etiqueta impessoal. Como esperar que criancinhas ainda acreditem que papai Noel existe? Vai-se mais uma magia: a expectativa do acontecer.
Não escrevo envolvida em clima saudosista, apenas estou triste. Escrevo como constatação de algo que se foi. Escrevo sobre o Tempo e as transformações que vêm quebrando tradições que duraram muitos séculos. Confesso que na minha memória permaneceu o Papai Noel e seu trenó. Mesmo aqui nos trópicos, a imagem é forte e tem momentos, como hoje, que ainda acredito nela. O trenó que deslizava no céu estrelado é bonito com todos os presentes dentro da caçamba. As renas, eu as achava os mais meigos e doces bichos, apesar de jamais haver visto uma. Influência de Walt Disney? Imaginava que soltavam nuvens de névoa transparente de suas narinas, quentinhas, cansadas de tanta correria na noite mais festejada do ano. A árvore de natal da minha casa era decorada com tufos de algodão para simbolizar a neve nos galhos verdes do pinheiro natural. Mal comparando, a família estava frente à natureza, à criatividade aguçada com simplicidade, pouco brilho, um jantar especial.
Não sei dizer se foi melhor no passado. Sei que era menos artificial, menos vermelho, pouco brilho, a não ser aquele nos olhos das crianças.
Falta algo! Talvez a narrativa, talvez o amor se exprima hoje de maneira diferente, apesar de pairar a mesma vontade de festejar com alegria o momento. Talvez a imagem sagrada de Jesus Cristo – a meia-noite era colocada na manjedoura para simbolizar o seu nascimento, – tenha sido esquecida
Finalizando. Quer me parecer que, via de regra, a maioria de nós esqueceu-se de homenageá-lo. Afinal a festa é Dele, é para Ele e não só nossa!
Bettina, sua descrição do Natal lembra a da Clarice Lispector em Festa de Aniversário. Tudo, menos Natal, tudo menos festa.
O resto é saudades. Bonito texto, parabéns.