Minha pele,
por Sylvia Loeb

 

 

 

Minha mãe nunca me deixou tomar sol, estraga a pele, menina.
Enquanto outras crianças corriam ao ar livre, tomavam banho de mar, de rio, de cachoeira, de chuva, eu ficava na sombra protegida por chapéu, mangas e calças compridas. Quando fiquei mocinha, minha mãe me obrigou a usar luvas.
Sou branca feito a neve, a pele lisa, sem nenhuma marca, as pessoas me olham e ficam ofuscadas.

Minha mãe já morreu; a pele dela era marcada por bexigas e manchas em tons mais ou menos escuros, do marrom claro ao preto retinto. Muito sol, filha.

Ultimamente tenho notado algumas modificações. Há uma semana, pequenas manchas rosadas começaram a salpicar meu corpo.
Cinco dias depois, não só estão se espalhando, mas parecem mais escuras.

De preocupação, não saí mais de casa.
Faz três dias, a pele afrouxou nos braços, principalmente nos cotovelos, mais em um do que no outro.
Hoje amanheci com meu rosto amarfanhado.
Não estou mais acendendo a luz em casa, mantenho as janelas fechadas.

Minha mãe não me contou que existem seres que habitam por baixo de nossa pele, seres sufocados que repentinamente desejam vir à luz.

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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!

5 comentários

  1. ai, preservar a alvura da pele e da alma, e esses seres sufocados, são os diabretes da finitude? Não adianta deter o tempo, não é? E não podemos ser alvos para sempre …A autora tem descrito uma anatomia simbólica, com tonalidade emocionais bem variadas. Parabéns!

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