Meus tremores,
por Sylvia Loeb

Meus tremores são movimentos musculares involuntários, rítmicos, que envolvem meu corpo inteiro, até mesmo a cabeça.

Na primeira vez que isto aconteceu eu tinha 8 anos. Frequento neurologistas desde então, todos à procura dos motivos. Sou submetida aos mais diversos exames, causa não encontrada é o resultado. 

Não sabem o nome do fenômeno.

Eu o chamo de tremor cósmico.

Mais um motivo para não me levarem a sério.

Depois de percorrer todos os médicos do país, de consultar os maiores especialistas na Europa e USA, fui parar nos videntes e sensitivos que me receitaram orações e banhos de ervas. Nenhum resultado.

Meus tremores, de modo geral,  são de magnitude baixa, menores que 3,0, registrados pelos sensores espalhados pelo país. 

Isto mesmo, tenho tremores de baixa magnitude, iguais aos da terra quando começa a tremer. Outra coincidência é que os meus  ocorrem exatamente pouco segundos antes do acontecimento. 

Meu corpo é um sismógrafo, capto o que vai acontecer dali a instantes.

Terremoto na Amazônia? No Mato Grosso, no Espírito Santo?

Meu corpo começa a tremer segundos antes.

Terremoto no Japão, na Indonésia, Índia, Filipinas, em Papua Nova Guiné, Turquia, Estados Unidos, Haiti, Chile, onde tiver terremoto, meu corpo capta e treme junto.

Tremores cósmicos, é o que tenho.

Minha família ri, os médicos querem me medicar com antipsicóticos, os videntes, depois de exauridas todas as rezas e chás, me convidam para trabalhar junto.

Não ligo pra zombaria, jogo fora os remédios, não quero trabalhar com  sensitivo.

Prefiro causar.

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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!

5 comentários

  1. Sylvia, muito cara,

    Li seus textos. Todos nos quais há uma metamorfose ( será esta a palavra certa? não sei mas, é por ai) entre sua pele, seu rabo, seu sangue …
    Entendo que você, por esta via, coloca os pesares do tempo e da idade que, através das funções naturais e vitais do nosso corpo, passa um “alerta” na terceira pessoa ( faz sentido?)
    carinho
    B

    1. Betina, acho que agora entendi o que você chama de metamorfose. Sim, algo acontece entre a pele, o rabo, o sangue. A narrativa deriva, está falando de outra coisa, que surge a partir do pedaço do corpo.

  2. Placas tectônicas da memória…
    Fico feliz, na clínica, quando uma palavra provoca tremores [de nível três na escala Richter] no corpo do paciente [e no meu também, claro].
    Já a personagem do conto não precisa de divã: nasceu ciente dos impactos de variadas magnitudes…
    Nenhum tratamento dá certo? Não! E ela continua causando? Sim!
    Então, lembrei do alerta. Uma advertência de uma mulher mais velha para seu neto:
    ‘Na vida, cuidado pra não se curar demais’.
    Donde a conclusão: Que sobre sempre um basal de patologia pra que a gente se divirta…

  3. Gostei da analogia entre tremor e causar; um termo da juventude, chamar a atenção, provocar, “causa” deriva de algo que a provoca, que agora se torna provocativo. E o tremor? A velhice treme, o bebê treme, trememos de assombro, tremor cósmico; achar a causa funciona na medicina e na engenharia, mas nem sempre, no mais adivinhamos, cogitamos no meio da incerteza e agimos … causando? tremendo?

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