Meus cotovelos,
por Sylvia Loeb



Pra que me serve o cotovelo?

Além de me servir de apoio no beiral da janela para ver o movimento da rua, além de permitir que dobre o braço para lavar meus dentes, esfregar minhas costas no banho,  servir de prateleira para carregar pacotes pesados, além de permitir que escove meus cabelos, coce meu ombro, além de ser uma dobradiça pivotante, também tem funções mais nobres.

É no Muaythai,  arte marcial nascida na Tailândia, com 2000 anos de tradição, que encontrei o lugar de honra dos cotovelos, lugar de sangue e de saber.

Sem cotovelo não há Muaythai.
A cotovelada tem que causar dano, cortar, fazer o adversário sentir. Usar a ponta do cotovelo como uma navalha com o movimento certo a fim de cortar. Sangue é comum dentro de uma luta de Muaythai, faz parte do esporte.

Pratiquei Muaythai durante anos e além de aprender a utilizar os cotovelos como armas, entrei em contato com a filosofia budista, que requer prática e entrega. O treinamento físico é rigoroso, o espiritual também.
Através de rituais realizados antes dos combates procurei saberes fundamentais relacionados com a verdade, com a mente, com o conhecimento, procurei forças e proteção espiritual para o combate, proteção e sucesso.
Muitas vezes encontrei, outras tantas padeci de dores, decepção, desânimo.

Saí ferida, sangrei muito, mas na avaliação final, graças ao Muaythai  pude perceber o valor do cotovelo, articulação tão fundamental e tão invisível ao nosso olhar amoroso.

Com meus cotovelos, posso abraçar um corpo amado, bater um bolo cheiroso, carregar uma criança no colo, posso me acariciar quando bate a solidão, vestir uma roupa bonita, trazer uma fotografia para perto dos olhos, posso me coçar em qualquer espaço do meu vasto corpo,  fazer penteados atraentes, pintar meus olhos para seduzir, escrever uma carta de saudades, posso imitar a pose do Pensador de Rodin, posso lutar Muaythai.

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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!


4 comentários

  1. e podemos dobrar e desdobrar, o que faríamos sem dobrar? quando tudo é plano demais, uma dobra, quando torto demais, desdobra… que corpo sábio o nosso!

  2. Um espanto as possibilidades de um corpo. Temos consciência disto? Estou cada vez mais espantada de entrar em contato com este universo, que sempre esteve aí, mais ou menos silencioso.

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