Nasci ligado a um cordão que me conectava ao corpo de minha mãe. Usina de processamento ininterrupto, ela me alimentava de nutrientes e sopro de vida.
Assim que saí de dentro dela fomos separados, cortaram nossa ligação. Deixaram um toco pendurado no lugar do cordão, que apodreceu e caiu. Depois de uma semana do lado de cá, eu já tinha uma cicatriz, um buraco fundo e feio, no meio da barriga.
Fiquei só no mundo, minha mãe longe de mim, eu fora de minha mãe. Minha alma desassossegou.
Amanhã vou fazer uma laparoscopia exatamente pela cicatriz. Uma intervenção exploratória, estão desconfiados de uma sombra que me habita, nada de mais, me asseguram.
Tenho certeza de que vou reencontrar minha mãe me esperando, desta vez, ela dentro de mim.
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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!
Gostei da inversão. Procura da mãe, busca do cordão perdido é uma constância para todos, acho.
Tenho certeza que ela fica dentro da gente, para o bem para o mal.
Texto bom nos obriga pensar.
Concordo com você, a busca do elo perdido é uma constância, para o bem e para o mal, como você diz.
A mãe que espera dentro dela como sombra que a habita, seria um encontro na morte? Ou, encontrar a mãe interna cura, dissipa a sombra do desassossego e revitaliza o corpo. Sempre, ambas as possibilidades nos habitam: o assombro do milagre ou do calafrio.
Lili, sua leitura sempre amplia a narrativa do autor.
Incrível o que a escrita faz: a cada leitor, uma percepção.
Muito rico.