Meus dias estão contados, no dia 31 de dezembro de 2018, às 24h, dou meu último suspiro.
Estou cansado, devo confessar, é com certa alegria que vejo que meu tempo está acabando.
Fui testemunha de muitos acontecimentos na política, na ciência, na medicina, na tecnologia, nos costumes, nas artes. Em um ano, é como se a Terra tivesse dado mais voltas ainda em torno do Sol , virou o mundo de cabeça para baixo.
Minha posição é muito especial: com todo o poder que possuo, pois nenhum ser vivo sobrevive fora do meu manto, não tenho controle algum: nada que eu possa fazer tem potência para modificar o que quer que seja.
Apenas observo, embora tenha todos os sentimentos dos humanos.
Tenho momentos de tristeza, desalento e desânimo em relação ao que me cerca. Maus acontecimentos não faltaram, os jornais vão esmiuçar todos.
Se, entretanto, me fosse dada a possibilidade de viver novamente, aceitaria apesar de todas as ocorrências abomináveis.
O tempo, meu irmão gêmeo, pensa como eu: ele é paciente, não corre nem se apressa, não atrasa, apenas está aqui, na árvore que cresce, no bebê que se desenvolve, na chuva que cai, na grama que brota, na fruta que amadurece, na menina que vira mulher, na guerra que acaba. No rio que não para de correr, nas ondas eternas do mar, nas montanhas silenciosas, no vento que viaja.
Aprendi com o tempo, meu irmão gêmeo, que a vida é um fluxo interminável que, apesar de eu morrer em 31 de dezembro, outro vai nascer no dia 01 de janeiro, exatamente na hora em que eu fechar os olhos.
Um nascimento vem acompanhado de alegria, esperança e projetos.
Quero me despedir desejando a todos alegria, esperança e projetos.
O fluxo continua.
Com carinho,
2018
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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!
Surpreendente, Sylvia! De uma ideia banal, você criou esse texto tão fluido, cuja verdade só se revela depois da metade do mesmo!
Obrigada, Marco. Bom ouvir isto de você.
Palavras:
– tipoia
– limo
– correnteza
Outra para completar: cascalho
Paulinho, tá mais difícil do que um haikai.