Meu amor aprisionado,
por Sylvia Loeb

A sala iluminada por ramos de chuva de ouro; saladas frescas perfumadas com azeites e temperos do oriente, especiarias, perfumes exóticos, almíscar, mahlab nos esperavam à mesa.

Jazz suave, uma taça de Bellini: “coloque 4 colheres de chá de purê de pêssego em uma taça de champanhe. Lentamente encha o copo com champanhe gelado, esperando que as bolhas assentem”… O coquetel está finalizado. Mais uma taça de Bellini… 

Queijos cremosos envoltos em pistache e damasco sobre lâminas de torradas saídas do forno. 

A conversa entre as amigas rolava sem pressa… querem ir para a mesa?

Cuscuz marroquino aromatizado com folhas de hortelã, marinado em especiarias, o peixe fresco;  creme de grão de bico com textura de veludo em suas profundezas. O Bellini foi substituído, sem rumor, por vinho dourado, que escorria vagaroso pelas taças de cristal.

E a conversa fluía, preguiçosa…

E mais uma taça de vinho dourado, mais uma ainda.

Peras banhadas em mel e melaço de romã surgiram da cozinha, perfumando a sala, fascinando os olhares, aguçando os paladares.

Foi então que deu-se o acontecimento. 

Meu amor que estava aprisionado há tanto tempo irrompeu poderoso, potente, alegre tomando conta do espaço que lhe foi negado.

Expandiu-se : pedi perdão aos amores de quem me separei, perdoei os que me traíram, os amigos com que me desentendi, as pessoas em quem esbarrei.  Os cachorros e gatos que me foram indiferentes, os pássaros que trombam na minha janela, as plantas que deixo de olhar. Os motoboys que arrebentam meu retrovisor, os conhecidos que não me entendem, os que não gostam de mim, as pragas que comem minhas plantas, perdoei a todos, a todos pedi perdão.

Dois dias, dois dias inteiros vivi em estado de exaltação, de amor expandido. 

Hoje, enjaulado novamente, meu amor aprisionado.

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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!

Um comentário

  1. Amor reprimido desperto por especiarias e ambrosia, pelo afeto sem cobranças ou deveres, sem culpa ou remorso, estado puro do ser… no mais, prisões e dúvidas: amo, sou amada, sim, não, talvez, um dia passado, futuro; quando ou nunca? Agora.

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