Blog Clube dos Escritores 50 mais Lourdes Gutierres Mahatma Gandhi

Mahatma Gandhi,
Lourdes Gutierres

O Império alastra-se sempre. Conquista novos territórios. Deixa por onde adentra rastros de sua dominação. Traz código de conduta a que todos devem se submeter. Junto às armas potentes, soldados treinados para matar. Retórica apropriada. Advento de cultura civilizatória é o que propaga aos quatro ventos. 

Um nativo, aparentemente o mais frágil deles, quase sem roupa a cobrir seu corpo, marcha pelos povoados. Segue com passos firmes. Em sua mão, segura um cajado que risca no chão novo traçado. Segue rumo à independência do país da dominação estrangeira – não vá!, eles são muito poderosos e violentos – dizem aqueles considerados mais sensatos. O caminho poderia ser abreviado, mas estrategicamente, ele decide pelo mais longo, quase 400 km a pé. Na sua passagem atrai cada vez mais pessoas, formando-se uma multidão atrás de si.

Há fome. Há sede. Há cansaço. Nada o detém.  

O mar desliza seu azul pela praia, traz a água salgada. O pescador que se orienta pelas estrelas do céu, diante da constelação humana que se formou próximo à ondulação na praia, agrega-se para compor aquele cenário libertador – não precisamos mais comprar sal, ele está aqui na natureza, é só preparar, vamos!  – diz o homem do cajado.  Como todos os demais participantes, o pescador sabe que aquilo é expressamente proibido. A produção e a venda de sal precisam de autorização, constituem uma forma de controle social. O que poderia ser uma atitude razoável, o uso de recursos naturais sem despesa desnecessária, é considerado crime. No entanto, desafiar o poder é estratégia de luta. Assim, inicia-se ali mesmo o preparo e a comercialização do produto, o sal. Primeiro chegam as advertências – retirem-se todos daqui –  diz a voz de comando armado. O que ecoa vem de outra fonte – o sal é nosso, vamos continuar!

As ondas do mar se precipitam cada vez mais forte. Do sol escaldante, o suor a escorrer pelas faces. A galope, chegam soldados com cassetetes; atacam os que encontram à frente; estão com armas; ouvem-se tiros.  Na praia, impera a violência. A dor se espalha, o mar recua silente. Gotas de sangue tingem a areia branca. Recolhem-se prisioneiros, incontáveis. Nenhum deles sequer levanta a mão contra os algozes. Sofrem humilhações e maus tratos, sem revidarem – a nossa arma é a não violência, ahimsa –  repete o homem do cajado.

Há código. Há lei. Há repressão. Nada detém o movimento de libertação.

Segue em marcha o processo de desobediência civil, desencadeado pelo homem do cajado, Mahatma Gandhi, líder do movimento – sim, há regras, mas por que respeitá-las, se nos foram impostas, se são injustas? Um modo não violento de lutar, satyagraha, está colocado em prática; já havia sido elaborado por outros teóricos pacifistas.Mesmo assim, a repressão é brutal. A crueldade dos dominadores torna-se vitrine no ocidente, as notícias circulam. Cada vez mais pessoas se engajam na causa do povo dominado. Ao final, a vitória.  “Para um trabalho que se quer,  sempre a ferramenta se tem”, diria tempos depois um profeta literário do outro lado do mundo.

8 comentários

  1. Linda narrativa, Lourdes! Precisamos relembrar dessas figuras corajosas, para aumentar nossa coragem, dessa vontade inabalável, dessa convicção de princípios e valores, para neles se espelhar e nunca desviar de rumo! Muita força de expressão nos comove, revolta e convida a ter uma postura crítica diante da nossa realidade! Mais uma contribuição valiosa, amiga!

  2. Comovente narrativa que nos faz refletir e sempre lembrar como foi esse extraordinário espírito humano. Quanta grandeza!. Lourdes sua crônica nos lembra de um passado não muito distante, que nunca deverá ser esquecido pela humanidade.

  3. Parabéns Lourdes!
    Maravilhoso relato sobre um grande ser humano que fez historia na India, e que é um grande exemplo pra humanidade.

  4. Muito bom e oportuno esse texto. Gratificante recordar a grandeza desse homem pacifista que foi Gandhi, muito bem descrito por você.Parabens

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