Lindas palavras as suas. Você até acha que está falando a verdade. Sempre foi assim. Você me conquistou com esta linguagem simples e comovente. Só que para mim sobraram palavras e para você tomates temperados, violetas na janela e roupa lavada.
Quantas noites fiquei sozinha no quarto, o cheiro de cigarro entrando pelo vão da porta, enquanto você e os seus amigos cafajestes jogavam pôquer na sala. Quantas pescarias fez com eles no Pantanal, enchendo o barco de putas e cerveja. Tudo menos peixe. Nem se deu ao trabalho de esconder a foto de vocês com as vagabundas, peladas no barco. Não sei como não trouxe doença para casa.
Passei os dias arrumando os seus jornais lidos que larga no chão, a tua roupa aguardando desarrumada no nosso quarto como se aqui fosse uma lavanderia, preparando o jantar e sentindo-me abandonada.
Um dia na praça vi um novo açougue. O número do telefone dele era idêntico ao nosso, só um algarismo diferente. Aviso do destino? Por bisbilhotice olhei e vi atrás do balcão um rapaz loiro de olhos azuis. Nem parecia açougueiro. Comprei um pedaço de acém para fazer teu bife acebolado.
Passei a comprar carne todos os dias. O moço chamava-se Catarino, pobrezinho, que nome! Mas era lindo como um anjo. E anjo não era. Um dia ao abrir o embrulho em casa encontrei um bife de filé mignon. Pensei que fosse engano, mas não. O presente se repetiu. Nunca toquei no assunto. Um dia ao passar o troco segurou minha mão e nosso olhar selou a cumplicidade que existia através de bifes clandestinos.
Os filés, os deixava para você, que mastigava com boca impaciente sem perceber o que te crescia na testa. Seu pouco caso não me atingia mais. Catarino passou a fazer entregas a domicílio. Da cozinha passamos para nossa cama.
Quando nos deitávamos de noite, sentia o cheiro do Catarino. Nem o cigarro fumegante que você segurava nos dedos amarelos o encobria. Ao ver seus dedos, imaginava as horas que gastava no salão de barbeiro com a manicura, segurando tua mão. Lembrava das mãos do Catarino, macias de tanto trabalhar a carne crua. Ele sabia lidar com a carne.
Resolvi te deixar. Moro num quarto alugado e estou trabalhando. Melhor que ficar em casa esperando por você, chegando atrasado com bafo de álcool e o lenço sujo de batom. Não vou te contar meu endereço, se quiser descubra. De nada vai valer.
Catarino me visita sempre, e traz carne de presente. Às vezes traz lingüiças ótimas…Estou bem alimentada.
Espero que esta carta te faça desistir de mim. Não gruda. Que Deus te dê saúde e longos anos para usufruir suas baixarias.
Uau! Eu gostei bastante dela! Bastante!
Espetacular, é o mínimo a dizer. Bem-vindo!
Mulheres!