Os chips de memórias destruídas registrando o esquecível e o lancetado não esquecível transformados em borboleta metálica
Liliana Liviano Wahba
1º movimento
Deparou-se com o antigo HD, guardado para se um dia precisasse recuperar algo dele. Até que percebeu, em um clarão de entendimento, que nada havia a recuperar, nada que não tivesse já sido registrado, utilizado, renovado. Entretanto, não se pode descartar meramente, placas e chips, dados seus ali estão ao alcance de qualquer um. Deve ser antes destruído.
2º movimento
Destruir um HD, um objeto de mera materialidade, sem uso, deve ser fácil. Martelar? Jogar ácido? Ou simplesmente desmontar e chegar ao cérebro, os disquetes de informação, dois discos pequenos de alumínio, o resto é suporte, peças inócuas.
3º movimento
Aqui estão, dois CD, tão pequenos e frágeis, de consistência rija, a mão não os torce sem ferramenta. Aplica-se força nos alicates. Fácil… Matéria inerte. Neles há memórias. Quais? Não lembra. Muitas já foram transportadas, processadas em HDs posteriores, atualizadas. Como se atualizam as memórias? E aquelas subliminares, imperceptíveis? Estariam registradas também? Não saberia, será tudo lançado ao olvido. O alicate age, um som abafado sai de mim ou dos discos? Tocou na dor, a psicologia denomina de trauma, a dor de perdas e de morte, sem funeral. Para, hesita, isto é delírio, são somente logaritmos sem alma, destrua! Prossegue, retorce, sua, até que, finalmente, não há mais memórias ali. Somente matéria inorgânica.
4º movimento
Esvaziada, contempla o que restou dos disquetes. Afasta e aproxima o olhar, a luminosidade incide neles irradiando a forma que adquiriram. Pequena escultura nascida ao acaso: uma borboleta metálica reluzente.
Liliana, em 4 movimentos de alquimia, você depurou metais, chips, memória, afetos, emoções para que daí nascesse uma linda borboleta…símbolo de transcendência.
Instigante.
E ao final, a borboleta: transformação do que restou da memória. Linda simbologia, Liliana!
Liliana, que enigmática alegoria sobre a memória e o olvido. Essa borboleta voa?
Transcendência. A palavra “olvido” me pegou. Como se nunca a houvesse lido ou escutado.
Lilian,
gosto de todo os seus textos. São densos e claros . Comparam sentires com a materialidade da vida.
Guardei o texto que v. escreveu sobre o envelhecimento, distribuído no nosso lanche de final de ano na livraria.
Obrigada. Falam à alma!