Clube dos Escritores 50+ Elisa Dias Batista Autora convidada Jokinha

Jokinha e eu, por Elisa Dias Baptista, nossa autora convidada

Eu e Jokinha temos rituais alimentares que deixam a cerimônia do chá no chinelo. Ou melhor, sendo mais modesta, criamos apenas uma versão infanto-ocidental para esse demorado, sofisticado e tradicional ritual.

A nossa cerimônia do cafézinho brazuca é pautada com a mesma exatidão que o relógio que faz tic tac e com o cuidado com que o coração faz tuc tuc.

Mesa pronta. As vaquinhas da toalha sorriem pra gente mugindo bom dia.

Confortavelmente sentado no cadeirão verde e abóbora, Joka veste seu milenar pijama de ursos. A sua esquerda, Miu-Miu ( vovó Miu-Miu, prazer!) traja camisola de sábios gatinhos orientais. Miau miau miau.

Bem na minha frente a xícara de McQueen com granola e iogurte espera a largada. Devidamente cortada e arrumada em fila indiana no prato do Papai Noel, a manga exala perfume de incenso, à direita na mesa. Na mesma linha do prato de manga, à esquerda, pedacinhos de pão com mel olham para todos os lados, curiosos.

Atenção ! Nenhuma coisa pode estar fora dessa nova ordem mundial.

Começamos, logo de cara, treinando a paciência e a compreensão por todos os seres.

– Vovó explica pra granola que agora não dá. Não chegou a vez dela.

Com toda a gentileza que a gente precisa ter com os nervosos da vida, falo no ouvido da colher de granola com iogurte que Joka está com a boca cheia de pão com mel.

– Jokinha estou explicando, mas essas granolas gritam muito, não querem esperar, são nervosas demais.

Ele abre a boca e aponta a manga lá dentro. Levo a colher bem perto dele para que a granola veja com os próprios olhos que ainda não chegou sua vez.

– Ufa ! Parece que elas entenderam… já sei Jokinha … eu e a granola vamos ficar aqui quietas esperando você falar já… combinado? Só quando você falar já.

E agora vem a parte mais legal do ritual, porque requer uma incrível concentração e precisão de nós dois. Ele só fala já quando percebe que eu estou totalmente tranqüila e as granolas também. Não me resta nada a não ser respirar fundo, respirar, respirar…-

Jáaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!

– Aí que susto, Joka!!!

Ele ri gostoso esperando a colherada das impacientes granolas com iogurte. E não é que, para nossa surpresa, o pão pula das minhas mãos na tentativa de furar a fila e ocorre uma rebelião de mangas no prato do Papai Noel.

Sim, às vezes algo sai fora do controle. Quando a distração é minha, Jokinha corrige imediatamente.

– Agora é a vez da manga vovó!

Mas quando ele resolve burlar a lei porque a granola está mais gostosa do que o pão ou a fruta, a gente dá uma afrouxada na rigidez da cerimônia. E assim tenho passado meus dias, aprendendo a língua das batatas, do arroz com feijão e das granolas.

A cada – Estou satisfeito! – eu e Joka nos beijamos e sorrimos com a cumplicidade dos que partilham os grandes segredos da Humanidade.

– Vovó, como é seu nome de verdade?

– Vovó Miu Miu.

– Não! O seu nome de ver-da-de!

– Elisa.

-Não!!! Eu sou o Batman e você é o …

– Santa ignorância Batman. Meu nome é Robin!!!

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