Eu estava servindo no Tadjiquistão no auge da guerra civil. Havia combates entre as forças governamentais e os fundamentalistas islâmicos até na capital, Duchambé. O pessoal das Nações Solidárias estava proibido de sair de casa a não ser para ir trabalhar. Me congratulei de já ter feito o meu reabastecimento de gêneros alimentícios no outono em Tashkent, capital do país vizinho, o Uzbequistão, quando as estradas ainda eram praticáveis.
Continuar lendo#avozices #essesnossosnetos
FLECHA NOVÍSSIMA, por Luciano de Castro
(Para Ana Rita)
Esse negócio de escrever pra neto — nascido ou prestes a nascer — não é novidade na literatura. Basta uma olhadela no Google, e lá se encontrarão, aos montes, registros enternecidos de avôs e avós arrebatados pelo encanto da “avonidade”. Em 1980, Hélio Pellegrino escreveu um bilhete pro seu neto Francisco, que acabara de nascer. A amorável cartinha, donde roubei o título desta crônica, deveria ser entregue ao rapaz apenas na virada do século: dia 31 de dezembro de 1999, quando Chico estivesse com 20 anos.
Bye bye vesícula biliar, por Pricila Marchese, nossa autora convidada
A finitude me perseguia. Comi a última bolacha do pacote. Judith, a gata, fez companhia durante minha caminhada na esteira, com os olhos fixos e apaixonados como nunca. Terminei algumas crônicas que estavam em andamento . Será mesmo que vou desta para melhor? Chegando ao hospital, fomos encaminhados ao quarto.Coloco aquela camisola que mais parece o traje perfeito para a entrada no reino dos céus.
Continuar lendoESQUELETOS NO ESTACIONAMENTO, uma história de Blanche de Bonneval
Uma dezena de esqueletos humanos foram encontrados durante as obras de ampliação do estacionamento. “Tinha antigamente aqui um cemitério?” Perguntei a Abbo, o meu chefe dos serviços gerais. “Não senhora,” respondeu Abbo. Esses corpos devem ter sido enterrados aqui durante a guerra civil de 78/82. Teve combates encarniçados nessa área e morreu muita gente que foi enterrada onde faleceu. Eu sabia que muitos corpos foram sepultados do outro lado do jardim e – não quero assustá-la – outros tantos também foram enterrados ali atrás…
Continuar lendoIguais ante a lei, tabela científica de Eder Quintão
A tabela “científica” mostra que a lei é notavelmente igual para todos, tanto assim que, embora sejam identificados como eleitores bastante diferentes – no sentido de que não votam nos mesmos candidatos – eles são muito semelhantes em alguns pontos (mostrados em “bold”), obviamente cruciais, o que é fundamental para melhor distingui-los. Isso fica muito claro nos exemplos compilados na tabela abaixo salientando a irrelevância das diferenças frente ao império da igualdade que os aproxima tanto (asterisco no rodapé, embora menos relevante, no item que permite distingui-los mais claramente).
Continuar lendoEclesiastes 1:9 ou nada há de novo sob o Sol, reflexões contemporâneas de Carlos Schlesinger
E nós que amávamos tanto a revolução, que simpatizamos aos vinte anos com todas as causas populares que nos apareciam justas, onde ficamos e onde estamos ? Onde ficaram os cinemas das galerias, os bares para discussoes filosóficas e opção entre a Revolução Chinesa e a Cubana?
Continuar lendoÀs vezes eu volto,
Regina Valadares conversa com o Rio de Janeiro
sobre amores e fantasias
E quando vejo aquela paisagem, parece que vira uma chave dentro de mim. Eu volto. Mudo de alma. Volto. E voltar é muito bom. Mesmo quando não existe mais o que deixei. Mesmo quando não existe mais aquela que partiu. E lá vem aquele sorriso bobo, aquela alegria saltando dos olhos. O Cristo lá longe, o Pão de Açúcar ali e a freada louca do avião…
Continuar lendoAvenida Baxter,
crônica irônica e indignada
de Eder Quintão
Para os que nunca ouviram dela. Não era no exterior: era aqui mesmo, e longa, contornando dois corredores do hospital. Apensos aos postes hospitalares, refletindo
Continuar lendoIlhados na pobreza, crônica de Lilian Kogan
Na livraria do shopping, a mãe diz para o filho adolescente: “filho, é muito caro. Dessa vez, não vai dar.” Na mão do menino, um livro. O garoto ainda tenta: “mãe, eu já não pude comprar o tênis, nem a capinha do celular e, agora, não posso ter nem esse livro? Reparo na mãe, uma mulher bem simples. Ela olhava para o livro e para o filho, resignada.
Continuar lendoA Luz, a Sombra e o Tempo, por Carlos de Castro
Ganha largueza o panorama visto do alto. Vive-se um “aquecimento” do
tempo e, intuitivamente, percebemos o aumento da velocidade com que gira o
dia-a-dia em nossa pequena megalópole. Apesar disso, o tempo por vezes relaxa, espraia. Aqui e ali dá “um tempo” para si mesmo. Como pode?
CARAMELO, por Lourdes Gutierres
Já não há mais gente por aqui, não há mais casas, só se enxergam os telhados.
E, em um deles, o cavalo sustenta seu corpo, tenta se equilibrar na superfície
inclinada, seu olhar se estende no mar barrento e, entre tantos objetos arrastados, o corpo de um homem segue inerte nos tropeços das ondas. A noite tinge de tristeza o coração do cavalo em cima do telhado, sente frio, fome, mas precisa estar atento, patas firmes, olhos abertos.
Yamamura, por Lilian Kogan
Quando eu tinha uns 12 anos, Lilian, minha amiga e xará, veio com uma novidade incrível. – Vamos lá na loja Yamamura, quero te mostrar algo diferente que você vai adorar. Era o início dos anos 70 e da loja de lustres, que cresceu incrivelmente nos anos vindouros. Ficava numa rua entre a Rua da Consolação e a Avenida Angélica, era pequena e guardava um segredo bastante difundido na colônia nipônica, um cabelereiro no fundo da loja. É claro que precisávamos ir lá.
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