Recortei o título dessa crônica de um texto do jornal Estado de São Paulo que discorre sobre o cenário atual, político, no Chile. Uma crônica de Ariel Dorfman intitulada “O Que Pedem as Pedras no Chile” em que ele recorda as odes de Pablo Neruda que pedia que as pedras rompessem seu silêncio.
O jornalista tropeça em uma das calçadas de pedra descuidadas; bate o nariz no vidro de um carro e sangra muito.
O acontecido o faz refletir — não sobre calçadas — mas sobre o regime de terror de Pinochet e as mortes sem túmulos de pedra. Lembra que na Alemanha um grupo iniciou, em 1992, um movimento no sentido de emplacar uma pedra em cada casa de onde um judeu, homossexual, negro e comunistas foi barbaramente arrancado. A ideia é que o transeunte seja obrigado a lembrar-se das barbaridades impetradas por senhores do poder.
Não tenho conhecimento da realidade chilena hoje. Sei apenas que um candidato de esquerda foi eleito com promessas de um país mais equitativo. Porém, não foi seu tropeço e a analogia com a pedra que mais me chamou a atenção — apesar de nossas calçadas serem iguais àquela na qual Ariel Dorfmam caiu. Ele usa um termo que gosto, que conclui e explica o meu temor: Residência da Memória, equivalente ao mote “brasileiro tem memória curta”!
O ano apenas começa e para as eleições temos de um lado, um candidato palhaço, com um ego centrado que da caserna só aprendeu o que há de pior: o autoritarismo. De outro lado, um condenado por corrupção, salvo pelo gongo, mas ainda com processos em andamento. Um descontrolado que bate em mulher, um outro que (com propriedade) usou o conselho de Maquiavel ao aplicar que os meios justificam os fins e, por último, um que espanta o nosso povo paupérrimo que não tem sequer uma camisa puída e calças remendadas para ir trabalhar.
Por que escolhi o poético termo Residência da Memória como título deste texto?
Eu, todos nós, o povo, os bem nutridos e os menos sortudos, nos encontramos desalojados há 600 anos! Nunca abrimos a porta da nossa Residência da Memória para nos lembrar do passado, nem mesmo do mais próximo. Nossas pedras não contam a história.
Nos conformamos em continuar a pagar um aluguel exorbitante.