Era o ano em que diariamente contávamos os mortos… Assim lembraremos, agora, em 2021, já vão dois.
Dificuldades materiais e psíquicas serão contabilizadas, esperançosamente, após combater a pandemia com vacinas e imunidade de rebanho. Aquelas materiais em evidência são econômicas, laborais, políticas, educacionais, construção de habitat e vinculação à natureza.
As psíquicas intercalam estresse, depressão, adições, relacionamentos, valores. Haverá ensaios, crônicas, livros, posicionamentos de índole partidária distinta, cada um culpando o outro, pois, ainda que se desejem mudanças, estas tendências já estão impregnadas, quase que epigeneticamente.
Vivemos decerto o ano da sobrevivência assustada, o medo de uma contaminação invisível apesar de identificada e nomeada; imprevisível, roleta russa, se adoecer, como meu organismo vai reagir? E pior, as pessoas queridas estão protegidas?
A sobrevivência, pulsão de vida ameaçada, o terror trepidando e acelerando as batidas cardíacas ou abafando, quase que para ficarmos despercebidos; o vírus enganado com material inerte. Deixamos de usufruir, de dançar, de sexualizar. A exaltação maníaca também se fez presente, a negação, multidões, orgias dos sentidos, amanhã? Vive-se hoje.
A sobrevivência em sobressalto: presente! O que dizer da sobrevivência silenciada pregressa? Décadas que sub-repticiamente minaram nossa sobrevivência em progressão aritmética e, ao final, geométrica. Devastação de recursos naturais, extinção de animais e de flora, contaminação de alimentos, poluição em estratos não contabilizados – temos plástico no sangue – lixo, respiramos lixo, toxidade no ar, na água, na terra. Aumento de câncer; ingênuos controladores da natureza esquecemos que dela fazemos parte, proliferação desordenada e caótica mortífera no mundo material, nas espécies, incluindo – pasme! – a nossa.
Um novo tipo de afasia progressiva, sem as causas anteriormente detectadas ocorreu nos últimos anos. Toxinas cerebrais? Não se sabe ao certo, incapacidade de formular diálogos coerentes, metáfora de uma era, sem comunicação, somente palavras ocas agregando grupos, seguidores; basta um slogan, o lobo frontal anestesiado, emoção de baixa qualidade.
A sobrevivência silenciada acompanha a morte lentificada até que explode e traz os mortos à superfície.
A sobrevivência silenciada –
“após combater a pandemia com vacinas e imunidade de rebanho”,
cronica em poucas linhas, e palavras-chave, conta o que e como nos sentimentos…
Sobrevivência solitária em rebanho, contando os mortos…
Liliana, que Deus nos ajude!
Besos
O ano em que contávamos os mortos… Liliana, obrigada por escrever, precisaremos desse registro no futuro. tudo tão triste, tão escuro, metáfora de uma era, sem comunicação.