A dourada,
por Liliana Wahba

 

 

 

Perfeita, rara beleza e radiante em seu suave dourado, macio e desenhando luzes em sintonia com o sol. À noite destacava-se como claridade irrompendo na escuridão. Jovem, tão jovem, antes da puberdade e em pleno vigor. Solta e flexível, atlética e elegante, um prazer do olhar e da alma contemplá-la. A magistralidade das formas aliada a seu caráter, meiga, alegre, companheira, dadivosa e moleca, em constante movimento e busca de experiências. Fulgurava e despertava admiração e amor à primeira vista. Quem a visse se apaixonava de imediato, queria afagá-la, correr junto, percorrer os caminhos que ela adiantava com sua agilidade e curiosidade. O corpo ondulava, ritmicamente, desenhava no espaço e ali, onde estivesse, preenchia a natureza de vida, vibração, harmonia e respeito pelo ente consagrado pela criação. Ia se desenvolvendo bem, futuro promissor e anunciando tantas realizações, tantas alegrias e amizades, maternidade, viagens, descobertas. Bastou um instante, um choque elétrico de um portão na poça d’água para interromper o futuro e congelar o presente em estupefação e dor. Nada a fazer, fulminante; emitiu um grito e caiu inerte, sem volta, sem despedidas, assim, sem mais, se foi para sempre apagando toda a perfeição, levada pela morte que pouco se importa com quem há de carregar, abrindo vazios e lamentos, inúteis, mas homenagem ao que ela era, foi, deixou de ser. Nunca houve outra igual, rara, única, morreu com seis meses a bela dama reverenciada como um ser ímpar, qualquer que fosse sua espécie, por acaso, Rhodesiana.

 

LILIANA LIVIANO WAHBA – Psicanalista junguiana. Profa Dra da PUC-SP. Diretora de Psicologia da Associação Ser em Cena – Teatro de Afásicos. Autora de Camille Claudel: Criação e Loucura.

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