Após um ano de intenso trabalho e de preocupações do cotidiano, estava no aguardo das sonhadas férias a usufruir em locais diferentes dos habituais. Dizer, como em alguns panfletos, exóticos, era vulgar. Quando lhe perguntavam por que não alguma cidade europeia respondia que necessitava de natureza, e mais, de um natural desconhecido.
Não deixava de haver uma motivação exibicionista, imaginando a curiosidade dos amigos, mas era sincera na expectativa de explorar sensações vibrantes em paisagens inescrutáveis. Não lhe ocorreu naquele momento que havia tempos o mistério se fizera ausente e a realidade prosaica engolia o encanto da vida, pujante na juventude.
Um tanto distraída em devaneios, fazia a mala de modo prático e ordeiro, calças, camisetas, tudo esportivo, um vestido … E, de pronto, teve um estalo:
– Olá, preciso com urgência informação sobre equipamento de proteção para excursão paga que começa amanhã; o atendimento por telefone e virtual não funciona! Está péssimo, e consegui este canal pelo WhatsApp que se identifica como Léo: são vocês da Agencult?
– Olá, eu sou Léo! Antes de começarmos, poderia me passar seu endereço de e–mail para checar se já tenho seus dados?
– (digita endereço)
– Oi, Laís Wesler, identifiquei que já tenho seus dados aqui. Como posso lhe ajudar?
Selecione uma das opções no menu a seguir:
1. Instruções sobre cadastro e pagamento.
2. Informações sobre viagem.
– Quero informações sobre viagem.
– Informações sobre viagem: www.agencult.com
– Mas no site não tem contato e não dão a informação que necessito; o atendimento não responde.
– Informações sobre viagem: www.agencult.com
Legal, poderia indicar abaixo o quão satisfeito você ficou com o meu atendimento?
- Muito Satisfeito
- Satisfeito
- Neutro
- Insatisfeito
- Muito Insatisfeito
– (tecla) 5. Muito Insatisfeito
– Muito obrigado até mais!
Laís permaneceu muda, até porquê não tinha com quem falar, e começou a divagar sobre a viagem. Sem equipamento de proteção seria melhor desistir? Nem sabia se retornariam o valor investido e o site não iria esclarecer.
Tinham lhe avisado que o ônibus viria às 7h da manhã do dia seguinte. Era uma excursão que há tempos queria fazer; um pequeno grupo guiado nas cavernas de Son Doong, após caminhada por lugares pantanosos.
Uma amiga alertara: é inesquecível! Mas não esqueça o equipamento de proteção. E nem podia falar com ela, pois estava em um retiro na Índia.
Tentou lembrar como surgiu a ideia. Uma necessidade impalpável de adentrar no âmago da terra, de si mesma? Esperando encontrar um quê perdido e um quê achado. Essencialmente perdidos e achados, a cada instante nos achamos e nos perdemos novamente.
Em seguida cogitou qual equipamento seria necessário: botas, capacete, lanterna, cordas, boia, luvas de borracha, canivete, óculos, máscara contra gás, será? O que, entretanto, a protegeria da escuridão, do medo de ser?
Indecisa se devia cancelar a viagem, pensou com impaciência na conversa com o Léo automático e, subitamente, irrompeu o riso solto e sonoro: quando queremos proteção e nos respondem com evasivas somos obrigados a indagar o que de fato buscamos.
Muito bom e verdadeiro.!
Ao buscar o Ser é mais facil saber o q buscamos! Na verdade , buscamos nada a nao ser, Ser!
Gostei muito.
Carinho
Bettina, bom te ouvir, buscamos ser … parece simples, pudera
O ser-humano sempre buscou o Ser. E sem instrumentos de proteção… Por mais que os queiramos, não os há. Sem garantias… desde que o mundo é mundo. Gostei muito.
Lili, inquietos que somos, sempre à procura incessante de algo que nunca encontramos. Pobres Sísifos.
Liliana, muito bom “Essencialmente perdidos e achados, a cada instante nos achamos e nos perdemos novamente.”.
Vivemos essa montanha-russa e nem equipamentos temos para enfrentá-la. A viagem exótica é permanente, diária.