Os Odingás eram o casal mais velho da tribo. Na verdade, ninguém nunca, nem nas tribos vizinhas, tinha ouvido falar de gente tão velha!
Eram tão velhos que as pessoas não sabiam mais quando tinham nascido, só eles lembravam de si mesmos!
Nunca tiveram filhos. No início, ficaram muito tristes. Os Odingás amavam as crianças tanto quanto amavam ser adultos para poder cuidar das crianças. Mas o tempo foi passando e eles acabaram esquecendo que um dia tinham querido tanto ser pais. Os Odingás passaram direto de serem apenas crescidos para serem…avós! Foi assim. Um dia, um garotinho da aldeia ficou muito bravo com os pais e disse que ia mudar de tenda. Fugiu no meio da noite. Na margem do rio que cercava a aldeia, parou, com medo de continuar. Encolhido e sem saber como recuperar sua dignidade de criança fugida, ele ficou ali, mas já era muito tarde! E o garotinho não tinha planejado para que sua fuga acontecesse junto com a Lua Cheia. A Lua era Nova no céu. E estava muito escuro. De repente, ouviu uma risada. De mulher. Em seguida outra risada. De homem. Do meio do escuro surgiram…os Odingás! Há muitos anos eles não precisavam mais de sono e usavam a insônia para passear e contemplar as estrelas. Quando viram o pequeno, pararam e perguntaram o que ele estava fazendo ali àquela hora. Mas, que coisa mais surpreendente, não pareciam aborrecidos nem com pressa de mandá-lo de volta. Adultos estranhos esses, pensou o menino.
Os Odingás ouviram e lembraram de uma história que tinha acontecido num tempo tão longe que ninguém mais podia dizer se era verdade ou invenção. Mas era uma história tão boa! De uma garotinha que também tinha fugido da tenda no meio da noite. Se perdeu porque ainda era pequena demais para saber dos segredos da mata. E sonhou com um casal de velhos tão velhos quanto a Terra e que quando ela cansou de tanto chorar, ofereceram o colo macio do musgo das árvores para que ela pudesse dormir naquela noite. No dia seguinte, lhe ensinaram o caminho de volta para a aldeia! Não sem antes prometer que um dia ela se tornaria tão grande e tão forte que ia poder sair da tenda e se aventurar no mundo, mas que era preciso paciência e muita coragem para crescer tanto! A história acabou e nem a velha, nem o velho falaram mais nada. Ficaram quietos, ali, bem juntos, um de cada lado do menino.
O garotinho ouviu a história e pensou. Pensou. E pediu aos Odingás se poderiam levá-lo de volta para casa. O que eles fizeram no dia seguinte, é claro! Mas naquela noite, ficaram ali, bem juntos, um de cada lado do menino, contando dos nomes das estrelas…eles sabiam todos!
Aos poucos, os pequenos da aldeia começaram a procurar os Odingás quando estavam tristes ou quando não sabiam como continuar crescendo. E eles contavam histórias e essas histórias cabiam direitinho no coração das crianças.
Quando um dia morreram afinal, eram tão tão velhos que tinham visto nascer as maiores árvores da floresta! Mas o Grande Espírito de todas as coisas, achou que eles podiam continuar ajudando as crianças a encontrarem caminhos…e transformou os dois em avós encantados! São eles que surgem nos sonhos das crianças, ajudam a expulsar os monstros que moram no escuro e, quando elas se perdem, estão sempre por perto para ajudá-las a voltar para casa!
que linda metáfora para nossos avós e avozices, e para nossa interioridade povoada de monstros e de Odingás que apaziguam. Que assim seja!
Obrigada Lili, vindo de você esse elogio ao simbólico da historinha faz tão bem!
Que delícia!
Obrigada querida Lilian! Vc tb vai escrever uma história para sua Alice, né?
Que belo texto!
Obrigada Celine, saudades de seus poemas…
Bonito demais, Adília.
Precisamos de uns Odingás aqui pelas nossas paragens. As crianças estão tão perdidas na selva dos YouTubers, esses seres horripilantes que lhes roubam a infância!
Verada, Zulmara, precisamos de um tempo, algum tempo, qualquer tempo, para voltar a olhar para o céu….
Delícia de história!
Obrigada Carlos! Foi tão bom escrever isso! Me senti transportada!
Cara Adilia,
Poesia puríssima este seu relato de eistória.
Comovida com os Ondigás que, antes de chegar aos avós, achei que podia ser uma história do candomblé!!!
Fico com os Ondigás. Avós já vivo e sei como é sê-lo. Gostaria de ser ,eternamente, um Ondigá.
Fez bem a alma!
Obrigada Bettina querida, seremos odingás na memória deles, nas histórias que conseguirmos criar….
Que coisa linda, Adília querida! Vou ler no facetime para neto, que mora na Itália! Obrigada, viu! Bj
Esses nossos netos distantes…precisamos muito de odingás que os alcancem….obrigada Vicky
Eu tive meus Odingás quando criança. Tive a sorte de morar num vilarejo muito pequeno no meio de muitas árvores até meus 8 anos. Ouvi muitas histórias dos Odingás de lá, e fui muito abençoada por eles. Também estou virando uma Odingá e me surpreendo com isso. Agora, ao topar com seu continho, vi meu passado, meu presente e meu futuro nele. Gostei demais. Beijo, Odingá Adilia.
Obrigada Luzia querida, acho que é isso que estamos virando, odingás encantados com essa história de netos!