A batalha, por Sylvia Loeb


 

 

Vestido longo, maquiagem extravagante. Sapatos vermelhos, saltos altíssimos, cabelos soltos, um toque de perfume.

Arrumei a sala: espalhados pelo chão tapetes antigos, uma poltrona confortável para apreciar o maior espetáculo da terra. Até uma garrafa de champanhe – vou brindar sua entrada no palco.

Faltam quinze minutos. O sol ainda está brilhando, mas já vai escurecer. Uma gigantesca sombra vinda do Oceano Pacífico vai se depositar sobre a Terra, cobrindo o Brasil, cobrindo minha casa.

O céu vai ficar tão escuro que será possível ver as estrelas. Os animais vão ficar agitados e os pássaros vão se recolher aos ninhos. A minha “dama-da-noite”, imensa no terraço, vai se abrir.

Dizem que as pessoas enlouquecem, que  aumenta o desejo dos homens e das mulheres, que aumenta o desejo dos velhos. Dizem que enlouquece homem sem mulher, mulher sem homem.

De pé na varanda, paramentada para o espetáculo, vi a sombra se aproximando, imensa, densa, opaca.

O mundo, em suspenso, parou de respirar. Minha “dama-da- noite abriu-se sorrindo, perfumando a beira de uma cova.

Corri e fechei rapidamente as janelas, e antes que ela entrasse em minha casa, puxei as cortinas, acendi as luzes, as velas, as luminárias, os candelabros, os abajures, as lanternas, os fósforos.

Sentei em minha poltrona. Tomei um gole de champanhe, brindei a luz.

Não vou mais deixar de usar perfume. Um toque, apenas um toque.

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SYLVIA LOEB – É psicanalista e escritora. Visite seu site, acesse sua página no Facebook ou escreva para o email [email protected]!

4 comentários

  1. lindo texto! a sombra que vem se formando – e as velas expulsam a escuridão… Cheio de imagens fortes. Visuais. Todo dia quando a gente escreve é meio isso, será que não??

    1. Sim, todos os dias estamos espantando as sombras. Quando escrevemos, nos damos conta de que elas estavam lá. Escrever ajuda a dissipá-las, às vezes, totalmente, às vezes, um pouco.

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